ILSI em Foco – dezembro/19 – artigo

Leite A2 – leite que não contém a Beta Caseína A1

Anibal Eugênio Vercesi Filho, Rodrigo Giglioti e Gunta Gutmanis – Centro de Genética e Reprodução Animal – Instituto de Zootecnia de São Paulo

O leite bovino é uma importante fonte de proteínas na alimentação humana. Das proteínas presentes no leite, cerca de 80% são as caseínas. Estas se dividem em quatro grupos: alfa S1 (30-46% das caseínas), alfa S2 (8-11%), beta (25-35%) e kappa (8-15%). As beta-caseínas possuem 13 alelos: A1, A2, A3, A4, B, C, D, E, F, H1, H2, I e G. As formas mais comuns no leite de bovinos são as beta-caseínas A1 e A2 que se diferenciam pela mudança de um aminoácido na posição 67 da cadeia peptídica,  uma prolina na A2 por uma histidina na A1.

Estudos indicaram que inicialmente, toda população bovina continha apenas o alelo A2 e que através de uma mutação surgiu o alelo A1. A digestão da beta-caseína A1 no trato gastrintestinal humano e também no processamento do leite para fabricação de derivados (iogurtes e queijos) tem como um de seus produtos finais um peptídeo bioativo betacasomorfina7 (BCM7). A beta casomorfina7 (BCM7) ativa os receptores µ-opióides encontrados no trato gastrointestinal e no restante do corpo humano, sendo este composto o possível fator de risco para o aparecimento de problemas de saúde em humanos. A BCM7, foi relacionada a várias doenças: problemas coronarianos, alergia e diabete mellitus tipo 1 entre outros.

Atualmente, é considerado um potencial fator de risco para a síndrome da intolerância ao leite de vaca. Uma parte dos diagnósticos de intolerância à lactose podem ser em decorrência dos efeitos da beta casomorfina-7 no trato gastrointestinal, que é um fator importante para a ocorrência dessa enfermidade. Esses efeitos no trato gastrointestinal causados pelo consumo de beta caseína A1 são o principal motivo na atualidade para a recomendação do consumo do leite A2.

Um dos principais efeitos da BCM7 está relacionado à diminuição da motilidade intestinal através da redução da freqüência e amplitude das contrações.Vários estudos também têm apontado a BCM-7 como possível fator a contribuir com processos pró inflamatórios do intestino, o que pode levar a problemas no processo digestivo.

Na literatura atual um projeto realizado em humanos comprova que a ingestão da beta caseína A1, aumenta a dor abdominal e inflamação do intestino, e diminui a consistência do bolo fecal. Também há relatos na literatura de mecanismos através dos quais o consumo da beta caseína A1 pode potencializar os problemas digestivos decorrentes da intolerância à lactose.

Desta forma, podemos considerar que a princípio, o principal benefício do consumo de leite A2 se daria através de melhorias do processo digestivo, sendo que este é bastante variável entre indivíduos e que mais pesquisas devem ser realizadas para completa elucidação dos mecanismos fisiológicos envolvidos nesse processo.

 

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