ILSI em Foco – junho/2021 – artigo

Compostos bioativos presentes no azeite de oliva e seus efeitos sobre a saúde

Dra. Jane Mara Block: Laboratório de Óleos e Gorduras e Lipídios Bioativos (LOG/LIBIO), Departamento de Ciência e Tecnologia de Alimentos (CAL), Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC), Presidente da Sociedade Brasileira de Óleos e Gorduras – SBOG (2020-2022).

 

Os benefícios do consumo de óleo de oliva sobre a saúde da população têm sido objeto de muitos estudos nas últimas décadas. As evidências epidemiológicas de baixa incidência de doenças cardiovasculares e certos tipos de câncer relatadas para a população da região mediterrâneo, onde o azeite de oliva representa a principal fonte de gordura, estimularam estas pesquisas. Mas é preciso ter muito cuidado quando se atribui a um único componente da dieta estes efeitos sobre a saúde. Uma análise mais ampla e holística, que envolvem além da dieta, os hábitos de vida de uma determinada população, precisa ser realizada e a população em geral deveria ser esclarecida sobre estes aspectos. Além da alimentação saudável, a prática diária de exercícios físicos, reduzido consumo de álcool, o não tabagismo e o controle do estresse são fatores importantes que interferem na saúde. Da mesma forma não é possível atribuir a um único composto as características de saudabilidade do azeite de oliva. No azeite de oliva diferentes compostos possuem ação positiva sobre a saúde, incluindo os ácidos graxos monoinsaturados, compostos fenólicos, esteróis e tocoferóis.

Já foram reportados para os ácidos graxos monoinsaturados (Monounsaturated Fatty Acids –MUFAs), que representam 80% dos ácidos graxos presentes no azeite de oliva, possíveis efeitos positivos sobre o metabolismo lipídico, glicídico, pressão arterial, trombogênese e carcinogênese. Os estudos apresentam resultados controversos na literatura uma vez que é muito difícil fazer a associação deste ácido graxo isolado com os possíveis efeitos no organismo. Alguns estudos destacam que os benefícios do ácido oleico presente no azeite de oliva são resultado de um efeito combinado com outros compostos bioativos presentes como o hidroxitirosol, os tocoferóis e os fitoesteróis.

Os teores de  hidroxitirosol, que é o principal composto fenólico nos azeites de oliva, variam de  0,003 e 7,43 mg/100 nos azeites virgem e extravirgem. O principal composto fenólico presente nas azeitonas é a oleuperina, responsável pelo seu sabor amargo. A oleuperina encontra-se esterificada ao hidroxitirosol (3,4-dihidroxifeniletanol ou 3,4-DHPEA) e ao ácido elenólico. Durante a maturação e durante o processo de fermentação da azeitona o hidroxitirosol é formado pela ação das β-glucosidases, esterases e polifenoloxidase. Ao longo do desenvolvimento fisiológico da fruta, o teor de oleuropeína diminui drasticamente, aumentando o teor de hidroxitirosol e seus derivados nas azeitonas maduras. A atividade antioxidante, os efeitos benéficos para a saúde, o metabolismo, biodisponibilidade e a utilização do hidroxitirosol na formulação de alimentos com propriedades funcionais tem sido relatado na literatura nas últimas décadas. No entanto os mecanismos de absorção, transporte e formação de metabólitos provenientes do hidroxitirosol ainda não foram completamente elucidados. Existem relatos de que somente 10% do hidroxitirosol é disponível e que o restante seria metabolizado.

A atividade antioxidante in vitro do hidroxitirosol resulta da sua capacidade de sequestrar espécies reativas de oxigênio (EROs) impedindo a etapa de reação em cadeia da oxidação de ácidos graxos insaturados. Além disto o hidroxitirosol sequestra espécies reativas de nitrogênio (ERNs) e ânions superóxido e previne os danos causados pelo extresse oxidativo através da indução da atividade de enzimas antioxidantes in vivo como peroxidase glutationa, redutase glutationa e S-transferase glutationa. Outra ação reportada para o hidroxitirosol é a ação quelante de metais o que previne a ação catalítica dos metais na produção de espécies reativas de oxigênio. Além da atividade antioxidante, propriedades citoprotetoras também foram reportadas para o hidroxitirosol.  Entre os efeitos benéficos relatados para a saúde estão a diminuição para o risco de doenças cardiovasculares e o efeito de prevenção contra câncer de mama. Estes efeitos indicam que este composto possui potencial para ser utilizado como produtos terapêutico para a prevenção e/ou tratamento de doenças crônicas. Mais estudos em seres humanos são necessários para determinar as doses terapêuticas e para determinar os alvos celulares e moleculares dos compostos derivados de hidroxitirosol.

O teor de fitoesteróis total no azeite de oliva varia entre 1000 e 2000 mg/Kg e ocorrem principalmente na forma livre e esterificada. Entre os principais estão o β-sitosterol (75-90%), ∆5-avenasterol (5 a 20%), campesterol (até 4%) e stigmasterol (até 2%). Os fitoesteróis estão entre os 18 nutrientes/compostos bioativos/não nutrientes que já foram aprovadas pela Anvisa. A alegação padronizada aprovada para estes compostos é “Os fitoesteróis auxiliam na redução da absorção de colesterol. Seu consumo deve ser associado a uma alimentação equilibrada e hábitos de vida saudáveis”.

Os tocoferóis são um grupo de 8 compostos comuns em vegetais, principalmente em sementes oleaginosas, óleos vegetais, nozes e castanhas. Para azeites de oliva são relatados teores de tocoferol total entre 70 e 416,5 mg/Kg. No azeite de oliva entre 90 e 95% dos tocoferóis está na forma de α-tocoferol e as concentrações de β-, γ- e δ-tocoferóis são baixas (entre 2 e 5,4; 1,8 e 9,1 mg/Kg; e quantidades traços, respectivamente). Entre os tocoferóis o α-Tocopherol é isômero que apresenta a maior atividade de vitamina E. Quando se considera que a atividade do α-Tocopherol é de 100%, o β; γ; e δ- tocoferol e, o α e β-tocotrienol apresentam atividades de 50;10; 3; 30; e 5%, respectivamente. Além da atividade de Vitamina E os tocoferóis apresentam atividade como antioxidante in vivo e in vitro

Efeitos positivos para a saúde de uma forma geral são reportados para populações que apresentam uma dieta equilibrada, com consumo elevado de frutas, hortaliças, fibras, peixes e diferentes fontes de óleos e gorduras. Sem dúvida o azeite de oliva pode ser considerado uma matéria prima rica em diferentes compostos bioativos e o consumo de azeites de oliva de elevada qualidade, principalmente do tipo extravirgem, que mantém os compostos bioativos inalterados, deve contribuir para uma dieta saudável e para a saúde da população.

 

Referências

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