ILSI em Foco – julho/2021 – entrevista

Em nenhum outro tempo histórico a ciência e a pesquisa estiveram tão em evidência para o público comum. A pandemia despertou o interesse da sociedade para este universo ao mesmo tempo em que canais de comunicação foram criados para facilitar a compreensão da população a respeito da Covid-19, entre outros assuntos vinculados à pauta. Mais um motivo para lembrarmos a todos sobre o Dia Nacional da Ciência e do Pesquisador, celebrado em 08 de julho, e comemorarmos a data entrevistando o Professor Doutor pela USP e membro do Conselho Científico e de Administração do ILSI Brasil, João Paulo Fabi, acerca dos novos paradigmas para a ciência e a pesquisa a partir da pandemia do novo coronavírus.

IB: Quais os novos paradigmas para a ciência a partir da pandemia?

JP: Acredito que o principal paradigma é o constante aprimoramento de modelos de previsão e propagação de catástrofes naturais ou biológicas, como no caso de pandemias mundiais. Esses modelos devem ser alimentados com dados de pesquisas básicas sobre o meio ambiente, sobre os seres humanos (incluindo doenças basais e causadas por agentes patogênicos) e sobre o sistema de logística mundial. Dessa maneira, resultados de controle da pandemia ocorrerão de forma mais rápida, encorajando a população a acreditar mais nos cientistas. Respostas rápidas e coordenadas para qualquer tipo de calamidade auxilia na mitigação do avanço de ideias obscurantistas inibindo a disseminação de informações equivocadas, sem embasamento científico. A pandemia mostrou que quando os cientistas se unem para um mesmo fim, grandes descobertas podem ser efetuadas em um espaço de tempo muito curto. O caso do desenvolvimento das vacinas é um exemplo. Por fim, cito que medidas para evitar a propagação da pandemia de forma mundial podem não terem sido efetuadas de forma mais rápida possível, levando a população a desacreditar diversos sistemas institucionais responsáveis por sua segurança.

IB: Qual é o ganho para a ciência brasileira ao se aproximar de outros países?

JP: A diversidade de ideias e pensamentos científicos é essencial para o crescimento da ciência. A aproximação com outros países pode ser benéfica não apenas pela disponibilização de equipamentos de ponta, mas também pela troca de experiências com uma quantidade maior de cientistas altamente qualificados. Assim, os pesquisadores brasileiros poderiam ter novas ideias para aplicar na realidade brasileira.

IB: No âmbito da pesquisa, como o Brasil pode avançar após a experiência vivenciada no desenvolvimento das vacinas contra a Covid-19?

JP: Primeiramente eu acredito que devemos avançar como sociedade de uma maneira geral. A educação científica deve ser aprimorada para que não tenhamos uma propagação de informações equivocadas ou de curas milagrosas. Precisamos fazer com que a sociedade entenda o papel dos cientistas utilizando os meios de divulgação da melhor maneira possível associados à linguagem de fácil acesso. Essa pandemia mostrou que canais de comunicação científicos são essenciais para desmentir boatos e difundir conhecimentos científicos de qualidade. Para isso, precisamos avançar na conquista de maior unidade entre os centros de pesquisa e formarmos cientistas não apenas para ficar atrás da bancada, mas, sim, para buscar o conhecimento teórico de ponta. Eles devem traduzir esse conhecimento de forma que a população brasileira entenda o quanto os avanços científicos são importantes para o bem-estar da sociedade de uma maneira geral.

IB: Em relação a recursos, a pandemia traz novas perspectivas para o pesquisador brasileiro?

JP: Infelizmente estamos presenciando uma diminuição de verbas para a ciência brasileira como um todo, com exceção de algumas fundações de amparo à pesquisa. Acredito que os avanços que o Brasil conquistou na pesquisa durante a pandemia podem trazer mais perspectivas de recursos não apenas nacional, mas também internacional. Principalmente em relação às parcerias entre a academia e a indústria, pois os avanços mostram que a pesquisa no Brasil é muito ampla e pode beneficiar não apenas uma parcela da população, mas, sobretudo, a população brasileira como um todo. Quando os políticos entenderem essa situação, um maior aporte pode ser direcionado para a ciência brasileira, assim como mecanismos facilitadores de parcerias público-privadas e academia-indústria.

IB: Considerando as parcerias realizadas para a descoberta da vacina contra o coronavírus, é possível estreitar o diálogo entre a academia e o mercado daqui para frente?

JP: Devemos sempre buscar esse tipo de parceria, pois muitas vezes a academia desenvolve pesquisa básica que não mitigam as dores da indústria como um todo. As atuais parcerias realizadas para o desenvolvimento das vacinas mostram que, quando ocorre um diálogo multilateral entre a academia e a indústria, e não um diálogo unilateral, a inovação ocorre de forma mais fluida e em menos tempo. O processo tradicional de pesquisa e desenvolvimento adotada pela indústria apresenta várias limitações que podem culminar na baixa produtividade, e a inovação aberta pode trazer contornos favoráveis a essa situação. As parcerias do tipo academia-indústria para o desenvolvimento de vacinas em tempo recorde são exemplos de inovação aberta com real benefício para a sociedade e com o devido lucro para as empresas. Assim, acredito que o estreitamento desse diálogo entre academia e o mercado deva ser mais constante, direcionando diversos estudos de ciência básica para uma ciência aplicada na indústria e na sociedade, melhorando a saúde e a qualidade de vida da população.

 

João Paulo Fabi é Professor Doutor da Faculdade de Ciências Farmacêuticas da Universidade de São Paulo, onde formou-se farmacêutico-bioquímico, doutor e pós-doutor. Realizou estágios na University of Nottingham (RU) e na Wayne State University (EUA). Sua linha de pesquisa se baseia na descoberta de novos compostos bioativos. Os estudos científicos básicos e aplicados se expandem desde as bases moleculares das modificações químicas e bioquímicas dos bioativos até os benefícios à saúde humana da ingestão dos bioativos in natura ou quimicamente modificados na forma de suplementos alimentares. É Pesquisador Associado do FoRC (Food Research Center), um dos Centros de Inovação, Pesquisa e Difusão (CEPIDs) apoiados pela FAPESP.