ILSI em Foco – fevereiro 2021 – artigo

Importância das evidências científicas, da Pesquisa Clínica e como ela acontece no Brasil

Greyce Lousana – Diretora Executiva – Invitare Pesquisa Clínica, Presidente Executiva – SBPPC, Presidente da Comissão de Pesquisa Clínica Veterinária – CRMV/SP, Coordenadora do Fórum Permanente dos Comitês de Ética e Profissionais em Pesquisa – FOCEP. Membro do Conselho Científico-Tecnológico da ABIHPEC.

 

Nunca se falou tanto em pesquisa clínica, comprovação cientifica, pesquisadores e ciência de forma geral quanto nos últimos meses.

A pandemia fez emergir o debate sobre a relevância de estimular a pesquisa, garantir autonomia para os pesquisadores e recursos que possibilitem a continuidade de pesquisas independente de posições político-partidárias.

Falas tais como “eu acho que”, “eu ouvi dizer”, “faça uso do produto X que é ótimo”, “na minha opinião”, enfim, tais expressões, não podem dar espaço para o uso de produtos, processos, tecnologias e demais descobertas, sem que elas tenham evidências científicas que garantam sua qualidade, segurança e eficácia.

Mas o que é uma evidência científica? De forma bem simples, podemos entender como um conjunto de ações que quando realizadas de forma padronizada, por profissionais capacitados, em locais com estrutura física e de equipamentos adequados a cada tipo de pesquisa, respondem a uma pergunta. Dessa forma, uma pesquisa que mostre do ponto de vista estatístico, evidência científica robusta, poderá ser replicada, mantendo resultados muito semelhantes. 

Não faz sentido, do ponto de vista científico, que cada pesquisador realize uma pesquisa da forma como ele entender ser a melhor. Uma pesquisa exige método científico, ou seja, diante de uma hipótese, definimos um método consagrado e conduzimos nossa pesquisa seguindo rigorosamente aquilo que foi planejado. Caso existam alterações, elas devem ser justificadas, informadas para as mais deferentes autoridades regulatórias aplicáveis e, no momento da divulgação dos resultados, claramente exposto para os leitores. 

Quando conduzimos uma pesquisa seguindo padrões científicos, não existe resultado ruim, existe um resultado que é ou não verdadeiro. O importante é que os resultados sejam rastreáveis, confiáveis, replicáveis e tenham atendido aos requisitos técnicos, científicos, éticos e regulatórios. Podemos até não gostar quando os resultados das nossas pesquisas não conseguem comprovar nossas hipóteses, no entanto, não podemos “dar um jeitinho” para atingirmos aquilo que queremos. 

E a pesquisa clínica, qual sua relação com uma evidência científica? Muito bem, utilizamos evidências cientificas em todas as áreas do conhecimento. Dependendo da área e das nossas hipóteses, utilizamos diferentes metodologias. O importante é que tudo seja devidamente relatado. A pesquisa clínica, utilizando uma definição mais abrangente, ocorre quando o objeto do nosso estudo são seres humanos, denominados pelas normas locais como “participante de pesquisa”. Podemos ter a pesquisa clínica veterinária, mas vamos focar na pesquisa clínica com seres humanos.

Qual a razão de realizarmos uma pesquisa clínica? Por exemplo, se pretendemos avaliar a qualidade, segurança e eficácia de um medicamento, temos que garantir que testes não clínicos, que se utilizaram de diferentes metodologias científicas foram realizados e que a partir de um determinado momento, será preciso fazer testes clínicos, ou seja, nas pessoas. Tais testes também se utilizam de metodologias específicas, e só podem ocorrer após aprovações, no mínimo, do Sistema CEP/CONEP e da ANVISA. Para os que pretendem se aprofundar no tema, vale entender sobre fases de um estudo clínico, estudos adaptativos, estudos de mundo real, enfim, conhecer e definir o melhor desenho é fundamental. Fique atento, a pesquisa clínica pode ocorrer com diferentes produtos sujeitos ao controle sanitário, tais como medicamentos, cosméticos, alimentos, dispositivos para a saúde, terapia celular, enfim, são muitas as possibilidades e para cada situação, regras específicas devem ser seguidas.

Vale destacar que são os muitos os envolvidos na condução de uma pesquisa, laboratórios analíticos, laboratórios de medicina diagnóstica, empresas de logística, centros de pesquisa, patrocinadores públicos ou privados, CRO (contract research organization), ARO (academic research organization), Comitês de Ética, Agências regulatórias e tantas outras instituições. Enfim, são muitos os atores e em cada um desses atores, muitos profissionais, de diferentes formações estão envolvidos. 

De forma resumida, sem pesquisa clínica não teremos a garantia de produtos seguros, eficazes e com qualidade.  Uma pesquisa que não tenha resultados obtidos a partir do uso de metodologias científicas consagradas e, portanto, capazes de gerar evidências robustas não pode ter validade. 

Não existe pesquisa mais ou menos importante, existem perguntas que precisam ser respondidas por profissionais capacitados, que conheçam suas respectivas áreas de atuação de forma profunda, que entendam que só se faz pesquisa com planejamento, investimento, aprovações regulatórias, desenvolvimento e aderência a fluxos e processos controlados por um sistema de gestão da qualidade com indicadores, planos de contingência, ações corretivas e preventivas.

Se você pretende conduzir um estudo clínico, pense com o que você vai trabalhar, qual a sua pergunta, qual ou quais são as hipóteses levantadas, qual será o desenho do estudo, quais são seus recursos (humanos, equipamentos, estrutura física, financeiro), quem fará todos os processos regulatórios, quem fará e como será o controle do planejamento estratégico do projeto, enfim, não comece aquilo que não poderá ser finalizado.